ORIGEM E SIGNIFICADO DA PALAVRA CÂNON
A palavra cânon não é mencionada na Bíblia, embora a raiz da qual se deriva aparece em 1Rs 14.15 e Jó 40.21. Originalmente significava "junco" ou "talo" de papiro, capim-limão ou cálamo. Pelo fato dos juncos serem usados como réguas ou instrumentos para fazer linhas retas, "canon" passou a siginificar "medida" ou "haste de medição". O termo cânon foi empregado pela primeira vez como expressão teológica referente às Escrituras por Atanásio, bispo de Alexandria, na carta pascal às igrejas em que descreveu o conteúdo do Novo Testamento (307 d.C.).
A questão de quais livros pertencem à Bíblia é chamada questão canônica e, refere-se à coleção de livros que passaram pelo teste de autenticidade e autoridade; significa ainda que esses livros são nossa regra de vida. Como foi formada esta coleção?
Nosso conhecimento do processo de formação resultante no cânon fixo ainda é obscuro. Infelizmente não dispomos de documentos antigos dos escribas detalhando os diversos passos do procedimento que culminou na Bíblia hebraica. Dois comentários são relevantes. O processo foi longo e complicado e, provavelmente deu-se em fases ao longo de vários séculos da história dos hebreus. O esboço ganérico da formação da cânon a seguir organiza os dados disponíveis sobre o assunto:
FASE 1: Pronuciamentos detentores de autoridade.
Inicialmente a revelação de Deus aos hebreus era transmitida de forma oral na maioria dos casos. Mensagens como "Assim diz o Soberano Senhor" e "Ouçam a Palavra do Senhor" no Antigo Testamento, foram ditas por Isaias (1.10), Ezequiel (5.5), oralmente como receberam de Deus. Esses pronunciamentos foram passados às gerações seguintes com "Palavra do Senhor" na forma tradicional oral recebida.
FASE 2: Documentos formais escritos.
Em determinado ponto, palavras adágios e discursos divinamente inspirados foram registrados e preservados pela comunidade hebraica na forma escrita. Em certas ocasiões o pronunciamento e a escrita ou registro eram quase simultâneos, como o LIvro da Lei, em Êxodo 24.3-4; Josué 1.8, e o oráculo de Jeremias para o rei Jeoaquim em Jr 36. Em outros casos o documento da revelação divina acontecia certo tempo após o acontecimento ou a circunstância que inspirou a Palavra do Senhor.
FASE 3: Coleção de documentos escritos:
O processo de coleção provavelmente foi extenso e abrangente, sabe-se que os Salmos foram reunidos durante o período de mais de 500 anos. Reunir os escritos de experiências hebraicas com Javé em antologias e livros era em parte, questão de conveniência para a comunidade, permitindo acesso fácil e a conservação garantida dos documentos. Acima de tudo, representava o valor, a importância e a autoridade das obras reunidas para a vida religiosa da comunidade. Esses livros exigiam atenção especial do povo hebreu (Dt 31.24-27).
FASE 4: Seleção de documentos escritos e fixação do cânon:
Os detalhes do procedimento de seleção de documentos são obscuros, mas podemos discernir os critérios básicos aplicados com o propósito de escolher e delinear o cânon. Basta dizer que o consenso entre líderes religiosos hebreus orientados pelo Espírito Santo de Deus durante o decorrer da história israelita resultou no cânon hebraico das Escrituras Sagradas.
OS TESTES DE CANONICIDADE
Em primeiro lugar é importante lembrarmos que certos livros já eram canônicos antes de qualquer teste lhes ser aplicado. Isto é como dizer que alguns alunos são inteligentes antes mesmo de se lhes ministrar uma prova. Os testes apenas provam aquilo que intrinsecamente já existe. Do mesmo modo, nem a Igreja nem os concílios eclesiásticos jamais concederam canonicidade ou autoridade a qualquer livro; o livro era autêntico ou não no momento em que foi escrito. A Igreja ou seus concílios reconheceram certos livros como Palavra de Deus e, com o passar do tempo, aqueles assim reconhecidos foram colecionados para formar o que hoje chamamos de Bíblia.
QUE TESTES A IGREJA APLICOU?
1) Havia o teste da autoridade do escritor. Em relação ao Antigo Testamento, isto significava a autoridade do legislador, ou do profeta, ou do líder em Israel. No caso do Novo Testamento, o livro deveria ter sido escrito ou influenciado por um apóstolo para ser reconhecido. Em outras palavras, deveria ter a assinatura ou aprovação de um apóstolo. Pedro, por exemplo, apoiou a Marcos, e Paulo a Lucas.
2) Os próprios livros deveriam dar alguma prova intrínseca de seu caráter peculiar, inspirado e autorizado por Deus. Seu conteúdo deveria de demonstrar ao leitor como algo diferente de qualquer outro livro por comunicar a revelação de Deus.
3) O veredito das igrejas quanto à natureza canônica dos livros era importante. Na verdade, houve uma surpreendente unanimidade entre as primeiras igrejas quanto aos livros que mereciam lugar entre os inspirados. Embora seja fato que alguns livros bíblicos tenham sido recusados ou questionados por alguma minoria, nenhum livro cuja autenticidade foi questionada por um número grande de igrejas veio a ser aceito posteriormente como parte do cânon.
2) Os próprios livros deveriam dar alguma prova intrínseca de seu caráter peculiar, inspirado e autorizado por Deus. Seu conteúdo deveria de demonstrar ao leitor como algo diferente de qualquer outro livro por comunicar a revelação de Deus.
3) O veredito das igrejas quanto à natureza canônica dos livros era importante. Na verdade, houve uma surpreendente unanimidade entre as primeiras igrejas quanto aos livros que mereciam lugar entre os inspirados. Embora seja fato que alguns livros bíblicos tenham sido recusados ou questionados por alguma minoria, nenhum livro cuja autenticidade foi questionada por um número grande de igrejas veio a ser aceito posteriormente como parte do cânon.
A FORMAÇÃO DO CÂNON
O cânon da Escritura estava-se formando, é claro, à medida que cada livro era escrito, e completou-se quando o último livro foi terminado. Quando falamos da “formação” do cânon estamos realmente falando do reconhecimento dos livros canônicos pela Igreja. Esse processo levou algum tempo. Alguns afirmam que todos os livros do Antigo Testamento já haviam sido colecionados e reconhecidos por Esdras, no quinto século a.C. Referências nos escritos de Flávio Josefo (95 d.C.) indica a extensão do cânon do Antigo Testamento como os 39 livros que hoje aceitamos. A discussão do chamado Sínodo de Jamnia (70-100 DC) parece ter partido deste cânon. Nosso Senhor delimitou a extensão dos livros canônicos do Antigo Testamento quando acusou os escribas de serem culpados da morte de todos os profetas que Deus enviara a Israel, de Abel a Zacarias (Lc 11.51). O relato da morte de Abel está, é claro, em Gênesis; o de Zacarias se acha em 2 Crônicas 24.20,21, que é o último livro na disposição da Bíblia hebraica (em lugar de nosso Malaquias). Para nós, é como se Jesus tivesse dito: “Sua culpa está registrada em toda a Bíblia - de Gênesis a Malaquias”. Ele não incluiu qualquer dos livros apócrifos que já existiam em seu tempo e que continham relatos das mortes de outros mártires israelitas.
O primeiro concílio eclesiástico a reconhecer todos os 27 livros do Novo Testamento foi o concílio de Cartago, em 397 d.C. Alguns livros do NovoTestamento, individualmente, já haviam sido reconhecidos como canônicos muito antes disso (2Pe 3.16; 1Tm 5.18) e a maioria deles foi aceita como canônica no século posterior ao dos apóstolos (Hebreus, Tiago, 2 Pedro, 2 e 3 João e Judas foram debatidos por algum tempo). A seleção do cânon foi um processo que continuou até que cada livro provasse o seu valor, passando pelos testes de canonicidade.
OS LIVROS APÓCRIFOS
Os doze livros apócrifos do Antigo Testamento jamais foram aceitos pelos judeus ou por nosso Senhor, no mesmo nível de autoridade dos livros canônicos. Eles eram respeitados, mas não foram considerados como Escritura. A Septuaginta (versão grega do Antigo Testamento produzida entre o terceiro e o segundo século a.C.) incluiu os apócrifos com o Antigo Testamento canônico. Jerônimo (c. 340 - 420 d.C.), ao traduzir a Vulgata, distinguiu entre os livros canônicos e os eclesiásticos (que eram os apócrifos), e essa distinção acabou por conceder-lhe uma condição de canonicidade secundária. O Concílio de Trento (1548) reconheceu-os como canônicos, embora os reformadores tenham rejeitado tal decreto. Em algumas versões protestantes dos séculos XVI e XVII, os apócrifos foram colocados à parte.
O TESTO QUE DISPOMOS É CONFIÁVEL?
Os manuscritos originais do Antigo Testamento e suas primeiras cópias foram escritos em pergaminhos ou papiro, desde o tempo de Moisés (c. 1450 a.C.) até o tempo de Malaquias (400 a.C.). Até a sensacional descoberta dos Rolos do Mar Morto em 1947, não possuíamos cópias do Antigo Testamento anteriores a 895 d.C. A razão de isto acontecer era a veneração quase supersticiosa que os judeus tinham pelo texto e que os levava a enterrar as cópias, à medida que ficavam gastas demais para uso regular. Na verdade, os massoretas (tradicionalistas), que acrescentaram os acentos e transcreveram a vocalização entre 600 e 950 d.C., padronizando em geral o texto do Antigo Testamento, engendraram maneiras sutis de preservar a exatidão das cópias que faziam. Verificavam cada cópia cuidadosamente, contanto a letra média de cada página, livro e divisão. Alguém já disse que qualquer coisa numerável era numerada. Quando os Rolos do Mar Morto ou Manuscritos do Mar Morto foram descobertos, trouxeram a luz um texto hebraico datado do segundo século a.C. de todos os livros do Antigo Testamento à exceção de Ester. Essa descoberta foi extremamente importante, pois forneceu um instrumento muito mais antigo para verificarmos a exatidão do Texto Massorético, que se provou extremamente exata.
Outros instrumentos antigos de verificação do texto hebraico incluem a Septuaginta (tradução grega preparada em meados do terceiro século a.C.), os targuns aramaicos (paráfrases e citações do AntigoTestamento), citações em autores cristãos da antiguidade, a tradução latina de Jerônimo (a Vulgata, c. 400 d.C.), feita diretamente do texto hebraico corrente em sua época. Todas essas fontes nos oferecem dados que asseguram um texto extremamente exato do Antigo Testamento.
Mais de 5.000 manuscritos do Novo Testamento existem ainda hoje, o que o torna o mais bem documentado dos escritos antigos.
Além de existirem muitas cópias do Novo Testamento, muitas delas pertencem a uma data bem próxima à dos originais. Há aproximadamente setenta e cinco fragmentos de papiro datados de 135 DC até o oitavo século, possuindo partes de 25 dos 27 livros, num total de 40% do texto. As muitas centenas de cópias feitas em pergaminho incluem o grande Códice Sinaítico (quarto século), o Códice Vaticano (também quarto século) e o Códice Alexandrino (quinto século). Além disso, há cerca de 2.000 lecionários (livretos de uso litúrgico que contêm porções das Escrituras), mais de 86.000 citações do Novo Testamento nos escritos dos Pais da Igreja, antigas traduções latinas, siríaca e egípcia, datadas do terceiro século, e a versão latina de Jerônimo. Todos esses dados, mais o trabalho feito pelos estudiosos da paleografia, arqueologia e crítica textual, nos asseguram possuirmos um texto exato e fidedigno no Novo Testamento.
Fontes:
A Bíblia Anotada - Mundo Cristão
Panorama do Antigo Testamento - Editora Vida
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